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segunda-feira, 20 de outubro de 2008

O MOVIMENTO ANTROPÓFAGO

Em 1928, Oswald de Andrade e a artista plástica Tarsila do Amaral, depois de lançarem em 1925 o Manifesto da Poesia Pau-Brasil, aprofundam suas idéias modernistas com outro Manifesto - O Antropófago – que propõe "devorar" influências estrangeiras para impor o caráter brasileiro à arte e à literatura. Essa ampliação do primeiro movimento de 1925 ocorre no reconhecimento do caráter indígena de nossas raízes“Tupy or not tupy that is the question" – e no uso do humor como forma crítica e caracterizadora da identidade, do caráter do brasileiro – “ A alegria é a prova dos nove". Propunham, como se percebe pelas idéias apresentadas, uma transformação da estrutura patriarcal em matriarcal, o anarquismo sem repressões: "Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud - a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama." - A postura antropofágica como alternativa entre o nacionalismo conservador, anti-europeu e a pura cópia dos valores ocidentais: "Nunca fomos catequizados.(...) Fizemos Cristo nascer na Bahia. Ou em Belém do Pará." Ainda que idealizador do movimento, Oswald não produz obra poética dentro desse espírito antropofágico, e cabe a Mário de Andrade, com o romance Macunaíma, levar para a Literatura a postura anárquica do “Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz e contra todos os importadores de consciência enlatada.

Observe que a idéia de atacar a importação da cultura, desde os primórdios de nossa colonização pelo europeu, vai citando criticamente nomes significativos desse processo como o padre Antônio Vieira e o romancista José de Alencar: “... Contra o Padre Vieira. Autor do nosso primeiro empréstimo, para ganhar comissão. O rei-analfabeto dissera-lhe : ponha isso no papel mas sem muita lábia. Fez-se o empréstimo. Gravou-se o açúcar brasileiro. Vieira deixou o dinheiro em Portugal e nos trouxe a lábia – “...Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O índio vestido de senador do Império. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos portugueses.
Porém, só as puras elites conseguiram realizar a antropofagia carnal, que traz em si o mais alto sentido da vida e evita todos os males identificados por Freud, males catequistas. O que se dá não é uma sublimação do instinto sexual. É a escala termométrica do instinto antropofágico. De carnal, ele se torna eletivo e cria a amizade. Afetivo, o amor. Especulativo, a ciência. Desvia-se e transfere-se. Chegamos ao aviltamento. A baixa antropofagia aglomerada nos pecados de catecismo – a inveja, a usura, a calúnia, o assassinato. Peste dos chamados povos cultos e cristianizados, é contra ela que estamos agindo. A nossa independência ainda não foi proclamada.
OSWALD DE ANDRADE Em Piratininga Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha." (Revista de Antropofagia, Ano 1, No. 1, maio de 1928.)