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quarta-feira, 16 de março de 2011

A METALINGUAGEM DA PRODUÇÃO TEXTUAL

O texto na cabeça, as ideias em processo de fermentação, mas parece que falta alguma coisa que não exatamente transpiração, afinal sua-se muito para escrever. Mas não é também apenas um processo de inspiração. Produzir um texto escrito é associar a um conjunto de normas pragmáticas outro processo de conhecimento que se adquire com a vivência. Temos assim a soma da racionalidade técnica com a emocionalidade crítica de nossa bagagem cultural. Muitas vezes, quando questionado por alunos de redação sobre qual a melhor fórmula para se produzir um texto, respondo que é o método TB – trovar bem – e que essa “trova” é o resultado de um adequado e necessário planejamento, aliado ao somatório de informações que vem se consolidando – ou não – ao longo de nossa formação pessoal, escolar e profissional. Quando utilizamos somente um desses processos, pecamos ou pela falta de argumentos, ou pela ausência de organização.
Costumo brincar com meus alunos que a redação não deveria ser motivo de tanta preocupação, afinal não passa de um “bilhetão” de vinte e poucas linhas, que necessita apenas de uma apresentação, um desenvolvimento e uma finalização. Mas a naturalidade dessa afirmação esbarra não exatamente na incapacidade de produção, mas na ausência do segundo processo: a quantidade e qualidade de informação. Grandes autores também se deparam com essa dificuldade e algumas vezes até fazem poesia disso: como não se lembrar de Drummond e de sua hora gasta pensando num verso que a pena não quer escrever. Assim o Carlos da poesia não é diferente do Pedro e do João da redação, e muitas vezes entre a primeira e a última dessas vinte míseras linhas forma-se um abismo de difícil transposição.
O auxílio de professores e o uso de material didático diminuem tecnicamente essa dificuldade, mas será insuficiente se for inativa a capacidade de apreensão e compreensão do mundo que nos cerca. O ato da escrita é também um processo de desnudamento do eu, de defesa de uma ideia que será motivo de apreciação pelo outro. Antes de expressar o que se pensa, está a preocupação com o que o corretor irá avaliar desse saber. E isso, obviamente, intimida, dificulta e, não raro, bloqueia a capacidade de produção. Certamente muitos leitores vão se lembrar de cenas engraçadas que vivenciaram ou presenciaram na fase escolar, quando, ao entregar um trabalho escrito, proposto em aula e sob a supervisão do professor, o aluno o coloca abaixo dos outros já entregues, certamente por já antecipar a fragilidade de seu texto. Essa falta de confiança não é exatamente ausência de informações, mas fundamentalmente insegurança na sua capacidade de realização de um trabalho escrito.
Certamente não há fórmulas mágicas que permitam capacitar um aluno a escrever. A singularidade desse processo deve fazer do professor, mais do que um corretor, um orientador. Assim, tão importante quanto como, é o que escrever. Cabe a esse orientador incutir no aluno a capacitação de discernir e filtrar informações que sustentem seu posicionamento na execução do trabalho escrito. Dessa forma torna-se possível argumentar, por exemplo, sobre a improbidade dos serviços públicos na concessão de controladores de velocidade, sem se deixar contaminar pelas cores partidárias, ou entender que a discutível qualidade da maioria dos programas televisivos é necessariamente compreender que isso é reflexo da capacidade de compreensão de parte considerável dos espectadores. Escrever, portanto, pode deixar de ser uma tarefa penosa e não precisa ser ufanisticamente algo que demande imenso prazer. Deve, isto sim, ter a inconfundível percepção, não do mundo que querem lhe mostrar, mas da realidade que entende e consegue explicar.

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